O Mato Grosso Econômico entrevistou o superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), Daniel Latorraca. Há 12 anos trabalhando no Imea e há 6 como superintendente, Daniel analisou e comentou as perspectivas sobre a nova safra de grãos e produção de carne em Mato Grosso, além dos casos de recuperação judicial de produtores no estado.
Confira os principais trechos da entrevista e no final da matéria o áudio com a entrevista na íntegra.
Mato Grosso Econômico: Estamos vivendo um super ciclo de alta das commodities desde o ano passado. Acredita que o preço da soja, milho, carne e algodão podem subir ainda mais?
Daniel Latorraca (Imea): Em relação ao cenário dos nossos principais mercados, é importante destacar que a gente tem historicamente nos últimos 18 meses, impactos por uma questão da pandemia. Antes mesmo da pandemia, a gente já tinha umas questões globais que estavam impactando os mercados, como por exemplo a peste suína africana na Ásia e na China, que já estavam aumentando a necessidade de proteína animal, um déficit estava sendo gerado com a doença, em especial em todo o sudeste asiático e em parte da Europa Central. Então a gente já vinha de uma maneira pressionados em questão de alimentos, em especial da proteína animal. Também quando a gente fala dos grãos, a gente vê nos últimos anos praticamente produzindo e consumindo no mesmo ano, sem ter um estoque de segurança a nível mundial, então quando veio todo esse momento atípico ano passado, particularmente do Brasil em março, você teve todo esse efeito do choque, em que alguns países buscaram primeiramente comprar tudo o que eles poderiam para fazer um estoque. Por exemplo a China, comprando a soja porque tinha no Brasil e nos Estados Unidos. Isso fez com que o preço tivesse um aumento muito expressivo já no primeiro semestre do ano passado.
Então todos os países não sabiam o que poderia acontecer com o comércio, lockdown, fechar as portas, ou seja, todas as possibilidades foram aumentadas. Até aqui em Mato Grosso, algumas cidades queriam fechar as atividades, não deixando por exemplo o caminhoneiro buscar a soja na lavoura para levar pro armazém. Tudo isso foi resultado e internalizado pra todo mundo, e como falei, países que estavam dependendo das plantações, da soja e do milho, e quando a gente fala de alimentos, você teve uma corrida inicialmente que fez todos os preços dispararem já no primeiro semestre. A única exceção dentro do estado do estado foi o algodão, que não é um alimento e sim uma cadeia têxtil, que na verdade teve um impacto extremamente visto de maneira negativa na pandemia, visto que com o lockdown fechou comércio, shopping, você não tinha também um cenário positivo de produção.
Mato Grosso Econômico: O recente caso do “mal da Vaca Louca” descoberto em Mato Grosso, pode afetar a perspectiva de exportação do Estado em 2021/2022?
Daniel Latorraca (Imea): Ele foi detectado, mas é um caso atípico, não é a doença de fato, mas sim por conta desses animais. A gente acredita que o Brasil está cumprindo todas as normas que regem os protocolos que estão assinados, nos acordos com os países, que são nossos parceiros. É natural essa suspensão inicial por conta de toda a análise do caso, que já está comprovado que é um caso atípico então a expectativa e esperança é que em especial a China e a Rússia, para que eles voltem rapidamente a comprar a carne que eles já vinham comprando. Por quê? Um, a demanda deles ainda continua forte para o mercado internacional, uma vez que eles ainda estão se recuperando daqueles déficits da proteína animal. E dois, que já está comprovado que o sistema sanitário brasileiro funciona, pois viu que foi um caso atípico, ou seja, não tem prejuízo nenhum, sob o ponto de vista de qualidade.
Mato Grosso Econômico: Temos visto muitos casos de recuperação judicial no agronegócio desde o ano passado. Exemplificando alguns: Grupo Gebert, Grupo Trentini, Grupo Viana, Grupo Wessner e Grupo Wochner, Grupo Francio, Grupo Pereira, Grupo JPupin, entre outros. Com tanta terra produtiva em Mato Grosso, incentivo fiscal da Lei Kandir e crédito rural com baixo custo e carência de pagamento, qual seria o motivo que grandes grupos terem entrado com pedido de recuperação judicial? Algum entrave na atividade agropecuária?
Daniel Latorraca (Imea): Temos que separar bem qual é o cenário do mercado e da situação financeira e econômica de cada produtor. Você tem um aumento de preço que gera oportunidades, e acredito que Mato Grosso tem muita oportunidade de crescer ainda nos próximos anos. Algumas decisões financeiras na iniciativa privada podem fazer empresas terem problemas e é o que aconteceu no nosso no nosso setor. Você vê e fala “poxa o preço então está subindo, deve continuar firme”. Mas os custos também subiram demais do ano passado pra cá, e se o produtor não trabalha bem dentro da lavoura e não consegue atingir uma margem boa nas suas compras com menos alavancagem, isso acaba aumentando o risco. Você pode, por exemplo, ter um bom resultado econômico, mas não financeiro. Ou seja, você é um bom produtor, colheu bem, só que todo aquele caixa que você gerou na safra já está comprometido com parcela e outras dívidas, e aí você na verdade não tem esse dinheiro. Então mesmo que o cenário de mercado tenha melhorado nos últimos anos, se o produtor também não fez a sua melhoria nas suas ferramentas de gestão financeira, de analisar com carinho a sua a saúde econômica, para não ter tanta dívida e às vezes não ter capacidade de pagar, você pode ter problemas mesmo no futuro.
Mato Grosso Econômico: Novo plantio de soja começando, a perspectiva é melhor do que a última safra, que foi impactada pela escassez hídrica e perda de produção, tanto na soja quanto no milho?
Daniel Latorraca (Imea): Estamos chegando nessa safra com uma estimativa de aumento de 3,5% na área de soja, indo para 10 milhões e 800 mil hectares. Como está muito no início, estamos colocando uma produtividade média recente de 57 sacos e uma produção de 37,5 milhões de toneladas, que seria um pouco maior do que a do ano passado. Do milho, infelizmente teve uma queda de produção, 32,5 milhões e o ano passado foi 35 milhões de toneladas. Houve uma queda esse ano, que a gente acredita que pode recuperar no ano que vem.
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Confira o áudio completo da entrevista abaixo