Somente a atuação conjunta do setor produtivo, indústria, revendas, assistência técnica e órgãos governamentais conseguirá evitar o problema da resistência de pragas, doenças e plantas daninhas nas lavouras de Mato Grosso. Essa é a opinião de especialistas que discutiram até ontem (1º), o assunto durante o III Seminário Mato-grossense sobre Manejo de Resistência, que está sendo realizado no auditório Cloves Vettorato, em Cuiabá (MT).
Durante o primeiro dia do evento, promovido pelo IMAmt, Fundação MT e Embrapa, o painel de abertura trouxe uma visão holística sobre a resistência. As causas do aumento da pressão de seleção de indivíduos resistência e as ferramentas disponíveis para evitar o problema foram apresentadas e discutidas pelos participantes.
Moderador do painel de abertura, o pesquisador Rafael Pitta, da Embrapa Agrossilvipastoril, aproveitou o evento, reunindo representantes de instituições de pesquisa, das indústrias, das empresas e de grandes grupos produtores, para propor a criação de um consórcio estadual de manejo de resistência, com participação de todos esses atores.
“Mato Grosso é o estado com maior produção agropecuária no país. Por que não ser pioneiro na formação de um consórcio anti-resistência? Seria um consórcio para promover ações de monitoramento regionalizadas, pesquisa e transferência de tecnologia. Um consórcio reunindo pesquisa, setor produtivo, indústrias e revendas”, sugeriu o pesquisador.
A ideia foi bem aceita pelos participantes e poderá ser mais discutida para viabilizar a implementação.
A resistência surge por meio de processos de mutação gênica em populações de insetos, fungos ou plantas daninhas decorrentes do uso sucessivo de um mesmo princípio ativo, ou do uso de subdoses, e da falta de observação de cuidados recomendados, como o uso das áreas de refúgio, por exemplo. O cruzamento de indivíduos resistentes forma populações com resistência.
De acordo com Marcelo Lima, da Agbiotech, há mais de 8.000 casos de populações de pragas resistentes a algum princípio ativo no mundo. Somente no Brasil já foram identificadas mais de 300 populações resistentes.
Ramiro Ovejero, da Bayer, destacou que o desenvolvimento de novos produtos leva de 10 a 12 anos, não sendo possível contar somente com as inovações da indústria e com o controle químico como forma de conter o problema. De acordo com ele, são lançadas novas marcas, mas com os mesmos princípios ativos, o que não resolve o problema. Da mesma forma, Goran Kuhar, da Crop Life Brasil, alertou que o tempo para desenvolvimento e aprovação de um evento transgênico é ainda maior, podendo superar os 16 anos.
Diante desse cenário, no qual não há uma única solução milagrosa, os palestrantes destacaram a necessidade de um esforço coletivo, no qual diferentes atores compartilham as responsabilidades.
“Programa de manejo de resistência funciona melhor quando todo mundo participa. Não é uma questão que envolve apenas indústria e produtor”, disse Ramiro Ovejero citando o papel da pesquisa, do desenvolvimento industrial, da disponibilização de produtos no mercado, da regulamentação governamental, da extensão, dos programas educacionais e de treinamento e dos programas de benefícios.
Apresentando o elevado número de espécies de fungos, plantas daninhas, insetos e nematoides aos quais as plantas estão expostas, Goran Kuhar lembrou que cerca de 40% de danos já são previamente esperados em uma lavoura. Para reduzir as perdas, devem ser usados diferentes recursos, como a biotecnologia, os insumos biológicos, a rotação de moléculas e a capacitação das pessoas que fazem as aplicações.
Ele mencionou como nova oportunidade de prevenção de resistência o Programa Nacional de Habilitação de Aplicadores de Agrotóxicos, Aplicador Legal. O programa exigirá a capacitação de todos os profissionais que atuam na pulverização das lavouras, abrindo a possibilidade de se abordar a questão da resistência nos treinamentos e de melhor orientar sobre as boas práticas que contribuem para evitar a pressão de resistência.
O uso de bioinsumos também se mostra como uma estratégia de grande eficiência. De acordo com Marcelo Lima, os biológicos têm menor probabilidade de adquirir resistência, uma vez que possuem diferentes modos de ação. Pesquisas apresentadas por ele demonstram que também ainda não foram identificados casos de resistência cruzada com eventos Bt.
REFÚGIO – Outra estratégia de manejo de resistência com grande relevância é o uso de área de refúgio. Porém, os palestrantes destacaram o fato de essa estratégia estar sendo negligenciada no Brasil. De acordo com Goran Kuhar, levantamento feito pela Crop Life Brasil, e ainda não publicado, mostra que 90% dos produtores sabem o que é e para que serve o refúgio, mas menos de 10% deles afirmam fazê-lo. As justificativas são variadas, passando pela falta de insumos no mercado, dificuldade operacional e baixa percepção sobre a eficácia da medida.
Renato Horikoshi, da Bayer, reforçou essas informações mostrando que a média de uso de soja com biotecnologia Bt vem crescendo no Brasil, chegando a 90% na última safra. Em alguns estados esse percentual supera os 95%. Números bem superiores aos 20% que deveriam ser dedicadas ao refúgio nesta cultura.
Áreas de refúgio são aquelas plantadas com cultivares sem a tecnologia Bt. Lagartas suscetíveis ao Bt conseguem sobreviver nessas áreas e cruzam com indivíduos que sofreram mutação e adquiriram resistência. Neste cruzamento há maior chance de gerar descendentes suscetíveis do que no cruzamento entre dois indivíduos resistentes.
SEMINÁRIO – Esta foi a terceira edição do Seminário Mato-grossense sobre Manejo de Resistência. Assim como nas edições anteriores, o evento busca apresentar resultados de pesquisas realizadas no estado, discutir as estratégias de manejo e possibilitar a interação entre diferentes atores do setor produtivo.