A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de aumentar a taxa básica de juros – a taxa Selic – em 0,25 pontos percentuais (p.p), para 15% ao ano (a.a.), é “injustificada” e vai agravar as condições de competitividade do setor produtivo, avalia a Confederação Nacional da Indústria (CNI).
“Não lidávamos com um patamar tão alto desde 2006. A irracionalidade dos juros e da carga tributária já está sufocando a capacidade dos setores produtivos, que já lidam com um cenário conturbado e possibilidade de aumento de juros e custo de captação de crédito. É um contrassenso o Banco Central se manifestar contra o aumento do IOF enquanto decide aumentar a taxa de juros. Aonde se quer chegar?”, questiona Ricardo Alban, presidente da CNI.
Segundo ele, é preciso pensar em políticas de Estado, de longo prazo e sistêmicas. Alban também lembra que o cenário compromete a capacidade de o Brasil aproveitar oportunidades abertas a partir da reconfiguração geopolítica em curso. “Insistimos na necessidade de pacto nacional para avançar com medidas estruturantes. O setor produtivo já exauriu sua resiliência.”
Para a CNI, a nova alta da Selic é incondizente com o cenário atual e prospectivo, pois a economia já manifesta os efeitos da política monetária constritiva, como a desaceleração da inflação. “Sem o início da redução da Selic, seguiremos penalizando a economia e os brasileiros. O cenário torna o investimento produtivo muito difícil no Brasil, com consequências graves para a economia”, reitera o presidente da CNI.
A deterioração do cenário já é percebida pelos empresários. O Índice de Confiança do Empresário Industrial (ICEI), da CNI, chegou ao sexto mês consecutivo de pessimismo. Nem mesmo durante a pandemia houve um período tão longo sem confiança. A última vez em que houve pessimismo prolongado no ICEI foi há cerca de dez anos, período de recessão econômica e de Selic em patamar muito elevado.
A CNI acredita que ao menos cinco motivos justificariam a interrupção do ciclo de alta da taxa Selic: taxa de juros real crescente; crédito caro; economia em desaceleração; menor impulso fiscal; e sinais positivos da inflação.
TAXA DE JUROS REAL CRESCENTE E EM PATAMAR EXCESSIVO – Com a decisão do Copom, a taxa de juros real subiu para 9,8% a.a., 4,8 pontos percentuais acima da taxa de juros neutra, aquela que não estimula nem desestimula a econômica, estimada em 5% a.a. pelo Banco Central. A Selic em 15% a.a. implica, portanto, em uma política monetária ainda mais contracionista e que confirma o Brasil na terceira posição entre as maiores taxas de juros real do mundo, atrás apenas de Turquia e Rússia. Não custa lembrar: a Selic está em campo contracionista há 41 meses.
CRÉDITO CADA VEZ MAIS CARO – Segundo o Banco Central, a taxa de juros média cobrada das empresas nas concessões de crédito, considerando as linhas com recursos livres, subiu de 20,6% a.a. em setembro de 2024, quando se iniciou o atual ciclo de altas na Selic, para 26% a.a., em abril de 2025. No mesmo período, a taxa média cobrada dos consumidores passou de 52,3% a.a. para 57,4% a.a.
“Do lado das empresas, os juros mais altos inviabilizam diversos projetos de investimento, essenciais para ampliar e modernizar a estrutura produtiva do país, e também aumentam o custo do capital de giro, essencial para o cotidiano das empresas”, avalia Alban. Do lado dos consumidores, os juros mais altos limitam a compra de diversos bens, sobretudo os de maior valor, que dependem mais de financiamento.
ATIVIDADE ECONÔMICA EM DESACELERAÇÃO CONTRIBUI NO CONTROLE DA INFLAÇÃO – Com o crédito cada vez mais caro e menos acessível, a economia dá sinais de desaceleração, o que justifica as previsões de crescimento do PIB menores em 2025. Chama atenção a queda de 0,1% no PIB da indústria no primeiro trimestre de 2025 frente ao quarto trimestre de 2024, após oito trimestres de crescimento. Cabe destacar que a produção industrial cresceu apenas 0,1% em abril, segundo o IBGE, e que isso não foi suficiente para indicar reversão do quadro negativo do primeiro trimestre.
MENOR IMPULSO FISCAL TAMBÉM FAVORECE CONTROLE DA INFLAÇÃO – Vale pontuar que a desaceleração da atividade econômica deve se intensificar em razão do menor impulso fiscal este ano. Afinal, a CNI estima que as despesas federais terão crescimento real de 2,8% em 2025, abaixo do crescimento registrado em 2024, que foi de 3,7%. Boa parte dessa redução se deve às políticas de contenção de despesas anunciadas desde o fim de 2024. “Essas medidas são positivas para equilibrar as políticas monetária e fiscal e precisam ser ampliadas”, defende Alban.
INFLAÇÃO DE MAIO COM SINAIS POSITIVOS – Em maio, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) desacelerou. Com o resultado, a inflação acumula alta de 5,32% nos últimos 12 meses, abaixo dos 5,53% observados no mesmo recorte, até abril. Parte da melhora no quadro inflacionário se deve à desaceleração dos preços de alimentos. As perspectivas desse grupo seguem favoráveis, uma vez que a previsão de safra em 2025 melhorou, passando de crescimento de 12,2% para 13,6%, segundo o IBGE.
Outro grupo que ajudou na melhora da inflação em maio foi o de preços de bens industriais, que também perderam ritmo entre abril e maio. Justamente por conta do dado do IPCA de maio, as expectativas para a inflação no final de 2025, que já vinham sendo revistas para baixo há oito semanas, foram consideravelmente reduzidas na última publicação do Relatório Focus, do Banco Central, de 5,44% para 5,25%, fortalecendo a percepção de melhora no horizonte.
VEJA COMENTÁRIOS DE ANALISTAS DE MERCADO:
Marcelo Bolzan, planejador financeiro CFP e sócio da The Hill Capital
O mercado vinha bastante dividido quanto à manutenção ou à subida para 15%, e foi uma decisão que podemos dizer que já era guardada. O mercado estava dividido, tinha argumentos aqui tanto para manter quanto para subir. Eu entendo que a subida foi um tom bastante positivo. Eles já deixam aqui um guidance, ou seja, uma sinalização dos próximos passos de uma interrupção do processo de subida de juros. Se tudo continuar como está, eles vão parar de subir juros e fazer uma pausa. Eles não falam aqui de um encerramento de ciclo, mas entendo que de fato é isso sim.
Minha expectativa aqui é que depois dessa subida de 15%, que a Selic continue nesse patamar até o final do ano, mesmo o Banco Central deixando em aberto. Acredito que é um fechamento realmente com chave de ouro. Os diretores do Banco Central poderiam já ter parado de subir juros até porque o mercado estava dividido, e eles optaram por fazer esse novo aumento. Então, sem dúvidas, vejo um tom hawkish.
A decisão mostra que eles estão sim comprometidos em fazer essa inflação convergir e acredito que vamos ter uma leitura bastante positiva para os mercados no que diz respeito às curvas de juros. A gente deve ter uma queda dos juros futuros na sexta-feira por eles terem sido mais duros, mais hawkish nesse momento atual.
Reforço aqui que, apesar de eles terem sinalizado uma interrupção do ciclo de alta de juros para examinar os impactos acumulados da subida de juros que já foi feita, para mim está bem claro que é um fim de ciclo e realmente continua em 15% até o final desse ano.
No mais, o comunicado continua trazendo aqui os balanços de risco tanto para alta quanto para queda aqui da inflação, então não teve nenhuma mudança em relação ao comunicado anterior. Ele comenta aqui em relação aos riscos do ambiente externo, mas ele dá um peso menor para o cenário internacional se comparado aqui com o último comunicado.
Para concluir, acredito que foi bastante positivo esse último aumento. Ele deixou em aberto, acho que ele não poderia falar que encerrou o ciclo, porque pode ser que ele tenha que fazer mais aumentos de juros no futuro, mas eu acho que eles fecharam aqui com chave de ouro, de ter feito essa subida adicional aqui e interromper o ciclo.
Na sexta-feira, a Bolsa pode ser que sofra um pouco porque toda vez que sobem os juros, isso acaba tendo impacto para a renda variável de uma forma geral. Mas como o mercado já vinha dividido, tinha uma probabilidade relativamente grande de isso acontecer, então acho que grande parte já está precificado.
COMO FICAM OS INVESTIMENTOS?
Leonardo Araújo, especialista em investimentos e sócio da GT Capital
Com a Selic tendo uma alta pontual, os títulos públicos seguem oferecendo um retorno muito interessante. Quando a taxa básica está nesse patamar, o custo de oportunidade de investir em outras classes como ações ou fundos multimercado, aumenta bastante.
Isso não significa que devemos abandonar o restante da carteira, mas sim que faz sentido olhar com mais carinho para a renda fixa pública neste momento. Para quem está mais conservador ou quer evitar grandes oscilações, aumentar a exposição a esses papéis pode ser uma boa escolha. Ainda assim, manter a diversificação continua sendo importante.
É bom lembrar que o Boletim Focus já aponta que a Selic pode cair para algo em torno de 10,50% nos próximos dois anos. Ou seja, quem trava hoje um título prefixado a 14% ao ano está garantindo um belo prêmio em relação ao que o mercado projeta para frente.
Nesse contexto, títulos vinculados à Selic fazem mais sentido para prazos curtos e médios, principalmente para quem quer liquidez e segurança. Nos Prefixados, o indicado é para médio e longo prazo e para quem deseja fixar a rentabilidade agora e levar até o vencimento. IPCA+ também é mais adequado para o médio e longo prazo, além de funcionar como proteção contra a inflação.
Se a ideia for garantir um rendimento mais previsível ao longo dos anos, o prefixado é uma ótima pedida. Já o Selic cumpre bem o papel de reserva ou parte da carteira mais tática, pois permite flexibilidade para aproveitar outras oportunidades que podem surgir.
Os títulos atrelados à inflação são fundamentais no Brasil pois vivemos em um país com histórico inflacionário. Ter IPCA+ na carteira é uma forma de proteger o poder de compra no longo prazo.
Sempre que o mercado começa a sinalizar o fim do ciclo de alta de juros, os prefixados ganham atratividade. Isso porque, ao travar a taxa agora, é possível garantir um retorno elevado por vários anos mesmo que a Selic comece a cair nos próximos trimestres. Hoje, ainda vemos prefixados com taxas acima de 14% ao ano, o que é um patamar bastante atrativo. Desde que o investidor esteja disposto a manter o título até o vencimento, faz muito sentido considerar essa alocação como parte da estratégia.
Lucas Ghilardi, sócio da The Hill Capital
Na questão da atratividade, não é segredo que os yields praticados hoje nos pré-fixados e IPCA+ estão em patamares historicamente muito elevados, o que é ótimo para o investidor.
Hoje notamos que o spread de crédito (diferença do corporativo para o público) está muito amassado. Apesar disso, a isenção do IR nos ativos corporativos pode compensar o pouco prêmio pago em relação aos papéis do governo.
Em suma, com o risco recente de tributação nos ativos isentos, achamos melhor continuar alocando em papéis do governo ou bancários neste momento. Acerca da renda variável, achamos que o momento ainda é muito delicado e não tão claro para uma tomada de decisão.
Considerando o cenário atual, entendemos que pré-fixados de curto prazo (2,3 anos) podem ser cavalos vencedores para os próximos anos. O Tesouro Selic sempre é uma boa escolha, pois protege o investidor de cenários incertos.
Mas na nossa visão, a melhor “aposta” é sempre em IPCA+ com duração média/longa (5,6,7 de duration), pois garantir um ganho real de 7% acima da inflação no Brasil para um período estendido costuma superar o CDI com “folga” em muito pouco tempo.
Para o investidor conservador, pode mirar sempre em ativos mais curtos, mas possivelmente não poderá garantir uma excelente rentabilidade por muito tempo. Este terá sempre que ir readequando a carteira conforme os ciclos de mercado.
Para o investidor mais moderado/arrojado, faz muito sentido entrar em papéis mais longos atualmente. O motivo é simples: o patamar de taxas está muito atrativo. A possibilidade de garantir 7% acima da inflação, ou 14% a.a. nas pré-fixadas, parece ser uma oportunidade ímpar para perpetuação, proteção e multiplicação do patrimônio.
O fim do ciclo de alta possibilitará que investidores “travem” as taxas em patamares próximos da SELIC atual, podendo surfar esses juros de 14/15% ao ano por mais tempo. Com a expectativa do mercado precificando uma Selic de 12,5% para final de 2026, o momento é excelente para mirar em pré-fixados de 2/3/4 anos remunerando 14/15% a.a.
Jeff Patzlaff, planejador financeiro CFP e especialista em investimentos
Com a Selic em um patamar histórico de 15%, os ativos pós‑fixados atrelados ao CDI/Selic são os mais seguros e líquidos do mercado, ideais para reserva de emergência ou oportunidades, pois oferecem disponibilidade diária com rendimento robusto.
Já, títulos atrelados a inflação, embora as taxas tenham recuado, ainda oferecem proteção real contra a inflação, com a inflação resistente em 2025 e juros permanentes no teto, são boas para objetivos de médio e longo prazo.
Em relação aos títulos prefixados, o investidor deve tomar cuidado com a marcação a mercado que é mais volátil. Com a janela de oportunidade entre juros futuros e expectativas de queda, estes títulos podem oferecer ganho se mantidos até o vencimento. Mas é prudente ter cautela, escolher prazos curto-médio, evitando exposição prolongada a volatilidade.
Já falando de crédito privado, é importante continuar acompanhando o desdobrar da MP, que pode estabelecer o fim da isenção em alguns títulos, mas eles ainda são interessantes. Por enquanto, o investidor deve procurar instituições sólidas, ou seja, bons emissores, com taxa acima do CDI, considerando isenção e liquidez.
Revise semestralmente a carteira, especialmente após Copom e fique de olho no cenário macro, rebalance caso inflação, Selic ou expectativas mudem, migrando entre Selic, prefixado e IPCA+ conforme cenário, e considere imposto de renda e liquidez para evitar resgates antes do vencimento que exponham a perdas.
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