O uso do cheque especial terminou maio em 3,9%, o menor índice desde 2010, quando a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) iniciou a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic). Em abril daquele ano, foi registrada a maior taxa da série histórica, quando essa modalidade de dívida chegou a 9,5%. Com a taxa de juros do cheque especial em relativa estabilização (variando entre 125% e 132% ao ano entre dezembro e abril de 2023), a renda média sem alteração significativa e a redução do ritmo de queda da taxa de juros, a aposta da Confederação é que há maior planejamento financeiro por parte das famílias brasileiras.
A Peic de maio registrou a terceira alta consecutiva do percentual de brasileiros endividados: eram 78,8% dos entrevistados, 0,3 ponto percentual (p.p.) a mais do que em abril e o maior desde novembro de 2022 (quando foi 78,9%). O índice está acima do nível de maio de 2023, quando eram 78,3%. Isso revela que as famílias continuam aumentando sua demanda por crédito, aproveitando o menor custo com juros. O saldo das operações de crédito para pessoas físicas aumentou 0,8% em abril, de acordo com o Banco Central, enquanto o crescimento acumulado em 12 meses acelerou de 8,6% em março para 8,9% em abril. Em relação às modalidades desse crédito, mesmo que tenha havido uma ligeira queda (0,2 p.p.), a maioria, 86,9%, está endividada no cartão de crédito.
Para o presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros, o fato de que mais pessoas estão endividadas, mas com queda do uso do cheque especial e estabilidade na inadimplência, é um bom sinal. “O avanço no mercado de trabalho, apontado na última Intenção de Consumo das Famílias (ICF), também apurada pela CNC, revela uma maior parcela da população empregada e assalariada e, assim, com mais condições de arcar com seus pagamentos”, afirma Tadros. Segundo ele, projeções da CNC mostram que o aumento do endividamento deve continuar, enquanto a inadimplência tende a se manter estável e aumentar mais perto do fim do ano.
INADIMPLÊNCIA ESTÁVEL – O percentual de famílias com dívidas em atraso manteve-se em 28,6% pelo segundo mês, abaixo do percentual de maio de 2023, quando a inadimplência estava em 29,1%. Já o percentual de famílias que não terão condições de pagar dívidas teve ligeira queda, de 0,1 p.p., e terminou maio em 12% – 0,2 p.p. a mais do que 12 meses atrás. O tempo médio de atraso nas dívidas também ficou estável em 64 dias, e o percentual dos que estão inadimplentes há mais de três meses teve ligeira queda de 0,1 p.p., chegando a 47,3% do total de endividados em maio. Por outro lado, houve aumento da proporção com atrasos entre 30 e 90 dias para 29,2%.
O economista-chefe da CNC, Felipe Tavares, explica que a estabilização no percentual de famílias com dívidas em atraso e a ligeira queda do percentual daquelas sem condições de pagar indicam uma leve melhora do cenário de inadimplência familiar. “Isso indica que as famílias estão lidando melhor com o crédito no orçamento familiar, mostrando uma maior consciência no momento de se endividar, aliviando os indicadores de inadimplência”, explica Tavares.
CLASSE MÉDIA – Ao analisar os dados desagregados por renda, pode-se perceber que a maior parte da população aumentou o seu endividamento, tanto em relação ao mês anterior quanto a 2023. A classe mais alta, com renda acima de 10 salários mínimos, foi a única com redução de suas dívidas (queda de 0,3 p.p. no mês e 3,6 p.p. no ano, atingindo 71,4% em maio). “Esses consumidores possuem mais recursos e, portanto, são menos vulneráveis às variações do crédito”, avalia Felipe Tavares.
Situação similar é observada em relação ao percentual com dívidas em atraso. No mês, houve redução de 0,2 p.p. na inadimplência das famílias mais ricas, com a taxa chegando a 14,4%. Na outra ponta, 35,9% da população de renda mais baixa está inadimplente, 0,1 p.p. a mais que em abril. Já para a classe média, que recebe de 3 a 5 salários mínimos e entre 5 e 10 salários, o destaque são as reduções de 0,8 p.p. e 0,6 p.p. na quantidade de consumidores que não terão condições de pagar as dívidas em atraso (maio encerrou com 9,6% e 7,9%, respectivamente).
A faixa de baixa renda, por menos opções de recursos, apresenta maior necessidade de recorrer ao crédito, assim como maior dificuldade de amortizar essas dívidas. Deve-se estar atento pelo fato de esse grupo ter aumentado seu endividamento em maio, mesmo tendo piora nos seus indicadores de inadimplência.