Entidades que representam o setor produtivo de Mato Grosso estão mobilizadas em torno da discussão do Projeto de Lei nº 1.833/2023, que estabelece uma distância mínima de 90 metros para a pulverização de defensivos agrícolas. No entanto, a Comissão Permanente de Saúde, Previdência e Assistência Social da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), busca ampliar essa distância para 300 metros.
O tema polêmico foi debatido ontem na audiência pública realizada ontem (18), na Sala de Reunião de Comissão “Sarita Baracat”, em Cuiabá. A votação do projeto de lei está prevista para hoje (19).
O setor produtivo esteve mobilizado na defesa dos 90 metros, contando com a presença de lideranças como presidentes de sindicatos rurais, produtores e entidades do agronegócio. A participação massiva dos produtores rurais reforçou a importância da manutenção do limite estabelecido pelo projeto, garantindo a viabilidade da produção agrícola e pecuária no estado.
O presidente da Famato, Vilmondes Tomain, destacou a relevância da mobilização do setor e agradeceu a presença dos produtores e presidentes de sindicatos rurais na audiência. “A unidade do setor produtivo foi determinante para mostrar a força do agro mato-grossense. Defendemos a distância de 90 metros porque contamos com tecnologias modernas e equipamentos avançados que garantem uma aplicação segura e eficiente. Agradeço a cada produtor, a cada liderança sindical que se fez presente e demonstrou que estamos atentos e comprometidos com a sustentabilidade da nossa atividade”, afirmou Tomain.
Segundo o deputado Gilberto Cattani, a proposta de sua autoria tem o objetivo de defender o pequeno produtor, garantindo que a regulação não prejudique a viabilidade econômica das propriedades rurais. “Meu projeto visa defender o pequeno produtor. A pessoa que estava gritando 300 metros, que não é nada para o grande produtor. Ele não liga. A maioria dos deputados defende a nossa causa. Ninguém quer envenenar ninguém. Queremos sobreviver e fazer com que as outras pessoas também sobrevivam”, afirmou o deputado.
Os produtores presentes enfatizaram que a distância de 90 metros é suficiente para garantir a segurança das propriedades que possuem agricultura, pecuária, áreas de convivência e moradias. Além disso, destacaram que o setor produtivo conta com tecnologias avançadas e equipamentos de ponta que garantem a segurança na aplicação de defensivos.
Foi citado ainda pelos produtores que o funcionário da fazenda, quando vai manipular um defensivo, usa Equipamento de Proteção Individual (EPI), tais como luva, macacão e máscara, para não ser contaminado. Existe uma série de técnicas que minimizam quaisquer riscos de contaminação.
MAIOR DISTÂNCIA – A proposta original já recebeu o 5º substitutivo integral e busca regulamentar a utilização de defensivos agrícolas em todo o estado. O 5º substitutivo integral é de autoria do deputado Lúdio Cabral (PT) e, segundo o petista, a norma ajusta o texto proposto por Cattani. “Será anexado ao texto os estudos e os artigos científicos validados para fundamentar o meu posicionamento e meu voto. A proposta não é política de governo, mas uma política de estado”, disse Lúdio Cabral.
O quinto substitutivo, apresentado por Lúdio Cabral, propõe que a aplicação terrestre de agrotóxicos e afins fique restrita a 300 metros de áreas povoadas e de mananciais de captação de água para abastecimento de população. A medida restringe a aplicação a 150 metros de mananciais de água, moradias isoladas e agrupamentos de animais e de 200 metros das nascentes, ainda que intermitentes.
O biólogo Lucas Ferrante afirmou que área de 300 metros longe dos corpos d’água para aplicação dos agrotóxicos é fundamental para a proteção das comunidades e para a proteção da própria agricultura. “Temos vários estudos que comprovam isso. Uma redução pode aumentar as contaminações, com a incidência de casos de câncer, de Alzheimer. Isso está muito bem documentado”, disse Ferrante.
O engenheiro agrônomo e especialista em tecnologia de aplicação, Paulo Bettini, afirmou que a redução da margem da área à aplicação dos defensivos agrícolas não traz prejuízo à meio ambiente e ao homem. “Utilizamos técnicas de produção e boas práticas de uso de produtos fitossanitários e existem informações sobre as técnicas de aplicações. Hoje temos tecnologia com equipamentos e máquinas de ponta para garantir maior segurança ao meio ambiente ao produtor rural”, afirmou.
O procurador do Ministério Público Federal (MPF) Gabriel Martins afirmou que o Fórum Mato-grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos não quer combater os agrotóxicos, mas sim, os impactos causados pelo produto, bem como os impactos que causam ao ambiente e a saúde da população. “Isso é de interesse coletivo, interesse de toda a sociedade. Já vi casos, a gente até levou à Polícia Federal, de uso de agrotóxicos para esbulho de terra, para tirar os assentados da reforma agrária, para tirar as pequenas propriedades, para que grandes produtores possam expandir sua área. São criminosos que usam o agrotóxico para esbulhar propriedades”, afirmou Martins.
O promotor de justiça do Ministério Público de Mato Grosso, Joelson de Campo Maciel, responsável ação civil pública que trata dos limites para a aplicação de agrotóxicos no território do estado, criticou a forma como os agrotóxicos são tratados, sendo transformados em defensivos agrícolas por meio de eufemismo.
“Aí vem aquela piadinha de senso comum, que acho muito ridícula, que é a diferença entre o remédio e o veneno é a dose. Não, não, senhor. O glifosato, se tomar, a longo prazo vai fazer mal. Por isso, o foco não tem que ser o tamanho da propriedade, o foco tem que ser o grau de toxicidade do agrotóxico”, explicou Campos Maciel.
A professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), que é um núcleo de estudos vinculado ao Instituto de Saúde Coletiva da UFMT, Márcia Montanari, disse que o núcleo está há mais de 20 anos pesquisando a relação temática da exposição química aos agrotóxicos e os impactos na saúde ambiente.
“Todo o produto tóxico utilizado na agricultura tem um grau de toxicidade. É só a gente olhar na bula do produto, toxicidade aguda, toxicidade crônica e, também, a toxicidade ambiental. A dispersão dos agrotóxicos acontece de diferentes formas, pode se dar por meio da chuva, pela própria absorção do solo e da contaminação dos lençóis freáticos, chegando de diferentes maneiras para exposição à população”, explicou Montanari.
Ela disse que em Mato Grosso, em 2023, foram utilizados 170 milhões de litros de agrotóxicos. “Somos o estado que mais utiliza agrotóxicos no Brasil, em volume, e o perfil de toxicidade, os mais utilizados são o glifosato, mancozeb, acefato, clorotalonil, 2,4-d, atrazina e malationa, temos que olhar com cuidado para a questão da toxicidade crônica. O seu uso a longo prazo pode causar cânceres e até malformações fetais”, disse Montanari.
Clique aqui e entre no grupo de notícias do MT Econômico e fique por dentro de informações relevantes