No setor elétrico, as empresas de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica ainda estão tentando entender como lidar com os eventos climáticos extremos para mitigar e aumentar a resiliência nos seus setores. E estes eventos têm chamado a atenção no setor elétrico do país pelos impactos sociais e econômicos que têm causado.
Exemplos recentes como os do dia 03 de novembro de 2023 e 11 de outubro deste ano na Grande São Paulo bem como no mês de maio deste ano no Rio Grande do Sul tornaram extremamente relevantes os impactos das fortes tempestades e inundações sobre o setor elétrico onde milhões de consumidores ficaram sem energia elétrica por vários dias. Outras contingências provocadas por ondas de calor extremo, como as que ocorreram no Estado de Mato Grosso em outubro de 2023, quando a mídia noticiou várias ocorrências, problemas de falta de energia e transtornos devido a queima de transformadores de distribuição, por sobrecarga em função da elevação do consumo de energia elétrica.
Os consumidores no país ficaram 10,43 horas em média sem energia em 2023 com uma frequência média das interrupções de 5,14 vezes. Porém, em eventos climáticos extremos, a falta de energia pode durar dias, o que certamente violaria estes indicadores DEC (horas) e FEC (quantidade de vezes) das distribuidoras. Nestes casos, conforme a legislação atual, este tipo de evento pode ser expurgado dos indicadores, sem penalização para as empresas distribuidoras. Diante disto torna-se necessário e oportuno que a ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica divulgue também os indicadores com expurgos, que traduz a percepção real dos consumidores sobre a qualidade da energia.
Os impactos no setor elétrico estão relacionados a vários aspectos. Na geração de energia, devido ao baixo nível dos reservatórios das hidrelétricas em períodos de estiagem, a energia gerada reduz causando dificuldades na operação e atendimento à carga. Na transmissão de energia em função de tempestades e vendavais podem ocorrer queda de torres e rompimentos de cabos ocasionando dificuldades para se escoar a geração das usinas e também para se transportar e energia de uma região para outra, além da influência das queimadas de vegetação sob o caminhamento das linhas, provenientes de longos períodos secos, e também da ação humana. Na distribuição de energia muitas contingências na rede de distribuição estão relacionadas a curtos-circuitos provocadas por descargas atmosféricas, quedas de árvores, ventos fortes e etc. Outras contingências podem ser provocadas por ondas de calor extremo, ocasionando problemas de falta de energia e transtornos devido a queima de transformadores de distribuição instalados nas redes de atendimento aos consumidores, devido à sobrecarga em função da elevação do consumo de energia elétrica. Podem ainda ocorrer problemas nas Subestações e nos locais atendidos por redes subterrâneas de energia ocasionados por inundações após períodos de chuvas intensas.
Para se aumentar a resiliência do setor elétrico frente aos impactos dos eventos climáticos, os sistemas de armazenamento de energia por baterias e de geração distribuída, poderão ter um papel importante para minimizar os problemas no fornecimento de energia elétrica provocados por redução de geração das hidrelétricas, danos nas linhas de transmissão ou mesmo danos nas redes de distribuição. No entanto, esta solução necessita avançar mais no setor elétrico nacional.
Este cenário de eventos climáticos extremos deve ser abordado nos novos contratos de concessão. Cerca de vinte distribuidoras no país que atendem cerca de 55 milhões de consumidores e cerca de 64% do mercado regulado de energia elétrica terão o término dos Contratos de Concessão entre 2025 e 2031, dentre elas se encontram: Enel SP, Enel RJ, Light, Energisa MT, EDP ES, Neonergia Elektro, Equatorial PA, CPFL Paulista, RGE Sul e outras. São concessões longas de trinta anos que merecem uma análise criteriosa considerando as novas realidades, inclusive de eventos climáticos extremos e outros desafios para a modernização do mercado de energia elétrica.
No Brasil o sistema elétrico em muitas situações tanto a nível de transmissão quanto de distribuição é dotado de certa flexibilidade operacional que permite em várias situações suprir a carga através de linhas ou redes alternativas complementares, quando uma é afetada, considerando tratar-se de um sistema interligado. Porém, é preciso neste momento identificar e analisar as vulnerabilidades frente a eventos climáticos extremos (ondas de calor, tempestades, raios, ventos fortes, inundações, secas, incêndios, deslizamentos de terras dentre outros) e, implementar medidas que minimizem o impacto no setor elétrico e por consequência a todos os usuários de energia elétrica do país.
Ressalta-se ainda que se tem observado ventos superiores a 130 km/h no Brasil, superiores aos parâmetros utilizados para dimensionamento das estruturas. Esta nova realidade climática deixa bem claro a grande relevância da energia elétrica e tem duas consequências para o setor elétrico: Investimentos para mitigar os efeitos e investimentos para adaptação e resiliência com o estabelecimento de novos critérios de projeto, planejamento, operação, manutenção e logística para atendimento do sistema elétrico.
O planejamento da rede para suprir determinas áreas do sistema elétrico por mais de uma fonte ou circuito alimentador bem como a tecnologia de “self healing” ou recomposição inteligente automática (utilização de algoritmos para identificar o melhor conjunto de manobras a ser realizado automaticamente, priorizando restabelecer a maior carga possível de forma segura e estável). Os consumidores por sua vez, além de investirem em energia solar fotovoltaica, estão começando a investir também em sistemas de armazenamento com a melhoria e a queda dos preços das baterias de lítio de 30% no último ano. O enterramento das redes tão propagado ultimamente é muito oneroso, limitando-se sua aplicabilidade a casos restritos e específicos, já que os custos para tal seriam repassados via tarifa para os consumidores, tarifa esta que já extremamente alta no país.
Por fim, cada vez mais a população espera uma resposta à altura e adequada por parte das empresas do setor de energia elétrica do país, necessitando de uma melhor integração e coordenação das mesmas com prefeituras, institutos climáticos, corpo de bombeiros, defesa civil, meio ambiente e outras entidades para planos de contingências e ações preventivas. Estamos num período de grandes incertezas no aspecto climático, onde eventos climáticos poderão ocorrer com mais frequências e intensidade, exigindo que as distribuidoras devam estar preparadas para se prevenirem e responderem mais rápido às demandas de continuidade do fornecimento de energia elétrica.
Teomar Estevão Magri, Engenheiro Eletricista com MBA em Gestão de Negócios, Especialista e Consultor em Energia
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