Que o Brasil vive uma polarização política suicida, não é segredo pra ninguém. Que o Brasil vive uma onda de ódio entre as pessoas também não é segredo. Que qualquer assunto pode, de repente, despertar ódios desconhecidos, também, é verdade. Que não existem mais mediadores nesse ambiente polarizado, também não é novidade. Que todas as vezes que uma nação volta-se contra si mesmo em radicalismo políticos, ela entra em movimento de suicídio nacional. Vide a Alemanha dos anos 1930. Vide a Rússia dos anos 1900.
Nunca saiu boa coisa num país onde o ódio sai de dentro dos palácios e dos partidos da política e invade a casa das pessoas comuns. Nenhum país saiu-se bem quando as salas de aula viraram palanques políticos para o cultivo do ódio e de pregações políticas ou ideológicas. Nos anos 1960, os Estados Unidos viram suas salas de aula virarem altares de comício racial. Tanto do lado branco, como do lado negro. O ódio ganhou as ruas em movimentos radicais como os “panteras negras”. Porém, era um radicalismo dos jovens negros contra o radicalismo dos brancos contra os direitos civis.
No Brasil, o conflito ainda não explodiu nas ruas, mas já dá fortes sinais dentro das famílias, das comunidades de relacionamento, nas redes sociais e na véspera de eleições gerais com ares de forte ódio nos partidos, nas relações sociais e nas cúpulas que disputam o poder pelos próximos quatro anos. Pra chegar às ruas é só um passo!
Posto isso, volto-me à mídia. A mídia brasileira nunca foi omissa em tempos de crise. Recordo a transição do regime militar para o civil. A mídia foi fundamental e equilibrada. Atendeu aos anseios maiores da sociedade em detrimento do poder governante.
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Porém, neste momento e neste ambiente de ódio coletivo, a mídia está fazendo o pior dos seus papéis. Em nenhum momento ela está pacificando ou noticiando com equilíbrio o contra e o a favor. Está incendiando o país com o pior noticiário possível. Lembremo-nos da pandemia do coronavírus. A mídia brasileira noticiou e criou o pior dos mundos com terrorismo deliberado pra assustar a sociedade. Tornou-se difusora de ideologias médicas, políticas, econômicas e até sanitárias! Infectou o leitor com o pior dos medicamentos: o ódio ou o medo.
Findo o noticiário pandêmico, faltam no noticiário boas notícias. Falta o relato das boas experiências que a sociedade construiu durante a pandemia. As novas relações de trabalho. As novas relações familiares. A solidariedade aprendida. O convívio humano aprendido na solidão dos sucessivos lockdowns. Faltam as novas ações das empresas, e até mesmo do serviço público sempre atrasado, nas novas relações humanas. A mídia concentra-se no ódio e no permanente decreto de ódio pelos males passados. Nunca pelos aprendizados que vem sempre depois das crises e das guerras.
Agora, às vésperas da eleição, sem as notícias da pandemia, a mídia envenena as relações sociais com o abuso na narrativa das diferenças políticas. No exagero das más notícias, nada serve como bálsamo. O mal sempre em primeiro lugar. Ninguém é bom. Todos são ruins. Tudo é ruim. Nada presta. Nada constrói. Temos uma mídia muito doente e irrecuperavelmente insana. Pessoas da linha de frente da saúde morreram nos postos de trabalho cuidando de tanta gente doente. Nenhuma linha de reconhecimento. Mas uma cama atravessada no corredor serve pra destruir vidas que se foram no trabalho da saúde. O mal sempre na frente dos registros do noticiário.
Como jornalista veterano, olho com surpresa essa mídia de jornalistas doentes e a sua mídia doentia. O futuro sempre registra os momentos da história. Terá muito pouco de bom pra reconhecer desse período sobre a mídia brasileira. Exceto, que esteve muito doente e, às portas da UTI. O que nos salva são as mídias sociais que, por instinto, nos levam para mais perto da vida real.
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso