Resultados preliminares das investigações da Delegacia Especializada de Defesa do Consumidor (Decon) sobre os empréstimos consignados aos servidores estaduais apontam que as fraudes ocorreram no momento da oferta dos produtos, ainda dentro da relação entre a empresa e o servidor.
Conforme o delegado Rogério Ferreira, titular da delegacia, não há indícios, até o momento, de envolvimento de servidores que atuam no Executivo Estadual.
“O Portal do Consignado o servidor pode autorizar que aqueles dados sejam consultados por empresas, isso é uma opção do servidor. Se ele não autoriza não é consultado. Esse portal dos consignados não é gerido pelo estado”, garantiu o delegado.
Ainda segundo o delegado, “os servidores públicos, numa situação de vulnerabilidade, de necessidade financeira, acabam sendo induzidos a erros por essas empresas que muitas vezes acabam cedendo, sem perceber, os seus dados, acabam cedendo sem perceber seu login e senha a portais do Governo e isso facilita a ação dos suspeitos. Os servidores acabam se tornando vítimas”.
As investigações apontam indícios da prática de dois tipos de fraude: no primeiro, as empresas oferecem empréstimos consignados aos servidores públicos estaduais e na verdade, o que é contratado, sem que o cliente saiba, é um cartão de crédito consignado. A partir da contratação, a empresa realiza um saque no cartão, que o servidor acredita ser o valor emprestado. E o que é pago mensalmente, não é valor da parcela do empréstimo, mas sim, do mínimo do cartão.
No segundo, são feitas promessas de portabilidade de empréstimos com juros menores e com uma espécie troco, um valor que será resultado das negociações e depositado na conta do servidor.
“Na verdade, elas não fazem negociação, o que elas fazem é a contratação de novos empréstimos em contrato em 96, 100, 120 ou mais parcelas. Para abrir margens para novos empréstimos, muitas vezes quitam empréstimos que já estavam sendo finalizados, tudo sem que o servidor saiba”, explicou o delegado.
Apesar das empresas terem contratos juridicamente corretos, segundo o delegado, a forma como foram feitas as ofertas para os servidores estaduais, com falta de informação ao consumidor e a indução a erro mediante afirmações faltas, é possível que as empresas onde forem constatadas estas práticas podem responder por crime contra a relação de consumo.
Conforme o delegado, as investigações foram abertas preliminarmente em 2024, mas com a criação da força-tarefa, ela foi intensificada. A Decon trabalha com quatro denúncias (boletins de ocorrência) que chegaram até as equipes e com mais de 3 mil páginas de documentos enviados pela Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado (Seplag), Controladoria Geral do Estado (CGE) e Procon.
Os próximos passos, conforme o titular da Decon, é começar a ouvir pessoas que possam contribuir com o aprofundamento das investigações.
FORÇA-TAREFA – Representada pela defensora pública de Cuiabá, Elianeth Nazário, a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso (DPEMT) participou da instalação da mesa técnica para discutir o superendividamento do funcionalismo público estadual, realizada nesta segunda-feira (26), no Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT). Durante sua participação, a defensora reforçou que a DPEMT deve se preparar para atender os assistidos que estão com altas dívidas de empréstimos consignados perante as instituições financeiras, que serão objeto de análise pelo TCE.
“As mesas temáticas são uma inovação legislativa e nelas os envolvidos buscam resolver assuntos de forma colaborativa e propositiva. A Defensoria Pública deve se preparar e capacitar para acolher esses milhares de servidores que estão em situação de vulnerabilidade extrema, pois contraíram empréstimos que os levam ao superendividamento. Portanto, nós da Defensoria iremos nos preparar para agilizar as ações que forem necessárias porque vemos que esta mesa técnica irá trazer soluções que darão ensejo a outras medidas diferentes da judicialização”, afirmou Elianeth Nazário.
Além da participação da DPEMT e de membros do TCE-MT, a mesa técnica também conta com a participação de deputados estaduais, servidores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, Ministério Público Estadual, servidores da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) e sindicatos de servidores estaduais.
O objetivo do grupo é trabalhar em propostas de regulamentação com regras mais rígidas para concessão de empréstimos consignados aos servidores efetivos e aposentados do estado de Mato Grosso. Isso porque os servidores realizaram diversas denúncias quanto a descontos indevidos, juros exorbitantes, falta de acesso aos contratos de empréstimos e mais clareza quantos aos valores e taxas.
Conforme levantamento fornecido ao TCE-MT pela Seplag, quase 60% dos servidores estaduais têm empréstimos consignados, com média de cinco contratos por pessoa. Destes, mais de 20 mil comprometem mais de 35% da renda com as dívidas, e 7,8 mil ultrapassam o limite de 70%. Só entre maio de 2024 e abril de 2025, os repasses às instituições financeiras chegaram a R$ 1,7 bilhão. Atualmente, o Decreto estadual nº 691/2016, regulamenta os empréstimos consignados e autoriza descontos de até 70% da renda líquida.
“O que estamos debatendo aqui é resultado de uma situação desorganizada que afeta diretamente a vida funcional dessas pessoas. O TCE vai atuar para organizar esse cenário, com sugestões e orientações. Uma das medidas é a revisão completa do decreto atual, que tem pontos confusos e autoriza, por exemplo, empréstimos de até 70% da remuneração. Também sugerimos à Assembleia Legislativa a criação de uma lei que estabeleça um teto claro”, afirmou o presidente do Tribunal de Contas, conselheiro Sérgio Ricardo.
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