A ocorrência de uma doença na lavoura está condicionada à junção de três fatores: o hospedeiro, o patógeno e o ambiente. Na safra 2021/22, a ferrugem asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, não trouxe grandes prejuízos ao produtor de Mato Grosso. O fator ambiente pode ter tido papel importante na baixa ocorrência, mas isso se deve, principalmente, à adoção de estratégias já conhecidas e validadas no manejo preventivo.
O fungo causador da ferrugem é de rápida disseminação e evolução em situações de campo favoráveis, e pode gerar grandes perdas nas lavouras nas quais incide. Dessa forma, essas estratégias são fundamentais, e as mais importantes no controle da doença são a implantação do vazio sanitário, a calendarização do plantio e o uso de cultivares de ciclo curto.
“Foi um ano tranquilo para o produtor de Mato Grosso, realmente. Ele teve incidência em alguns plantios que avançaram a janela de semeadura no final de novembro, mas nada preocupante. Na safra passada houve mais ocorrências, já que os plantios avançaram na janela até dezembro em função das restrições hídricas que ocorreram em algumas regiões no momento da semeadura”, lembra a engenheira agrônoma, Karla Kudlawiec, pesquisadora da área de Fitopatologia da Fundação de Apoio à Pesquisa Agropecuária de Mato Grosso (Fundação MT).
CONSÓRCIO ANTIFERRUGEM – O Consórcio Antiferrugem foi criado em 2004 pela Embrapa como uma das iniciativas para controle da ferrugem. Os dados revelam que até o dia 23 de março, a safra de soja 2021/22 acumulou 214 casos da doença. Ao todo, 12 estados tiveram ocorrências, sendo a maioria em Mato Grosso e Goiás, respectivamente com 80 e 72 registros.
Na sequência, o Paraná somou 16 ocorrências, em seguida Rio Grande do Sul teve nove, e Bahia e Mato Grosso do Sul, cada um com oito. Tocantins teve seis, Piauí registrou cinco, São Paulo teve quatro ocorrências, Maranhão três, Minas Gerais duas e Roraima apenas um caso.
Ainda segundo o Consórcio, a safra 2020/21 finalizou com 377 ocorrências da ferrugem, e a 2019/20 com 213 registros, até então a safra com o menor número desde 2006/07.
MANEJO DA DOENÇA – A soja permanece no campo por aproximadamente 120 dias. Durante esse período, a cultura está exposta aos mais diversos fatores bióticos e abióticos. O fungo causador da ferrugem completa um ciclo, em média, a cada sete dias e por isso é considerado policíclico. Os esporos começam a ser liberados em torno de cinco dias após a infecção e uma urédia (estrutura reprodutiva) permanece liberando esporos e disseminando a doença por até três semanas.
A pesquisadora da Fundação MT explica que quando há janelas de plantio mais extensas, maiores quantidades de aplicações de fungicidas são necessárias em uma mesma safra, e em diferentes locais, a fim de contemplar toda a safra da cultura. Embora haja fungicidas com diferentes modos de ação, em safras que requerem mais aplicações ao longo do ciclo, são maiores as chances de seleção de populações de isolados resistentes.
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“O inóculo da ferrugem acaba sendo exposto a uma maior pressão de seleção aos fungicidas que aplicamos, quando há uma janela maior. Mas, quando se concentra o plantio, a população de inóculo sofre o efeito dos fungicidas aplicados ao mesmo tempo, então reduzimos essa chance de selecionar mais populações de indivíduos resistentes”, acrescenta Karla.
Além disso, a especialista afirma que a concentração da semeadura no início do período autorizado, lança mão da estratégia de escape. Na safra 2021/22, de acordo com os dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), em 26 de novembro de 2021, 99,35% das lavouras já estavam semeadas em Mato Grosso.
Uma das mais importantes estratégias criadas para baixar a pressão do inóculo é o vazio sanitário, estabelecido em 2006. Ele determina a ausência de plantas de soja em Mato Grosso entre 15/06 a 15/09, visando reduzir a quantidade de inóculo na entressafra, postergando o aparecimento da doença na safra seguinte.
PROJETOS DA FUNDAÇÃO MT – A área de Fitopatologia da Fundação MT conduz diversos ensaios a campo, com o intuito de monitorar a ocorrência e o controle da ferrugem asiática em Mato Grosso. Os experimentos com essa finalidade estão instalados em Primavera do Leste, Campo Verde e na Serra da Petrovina.
“Fazemos o manejo completo, simulando o que o produtor faria em campo, e contemplamos diferentes cenários do Estado para entender a performance dos produtos em diferentes regiões, isso é bem importante. Cada região pode ter populações de isolados diferentes, que vão responder de forma diferente à aplicação dos fungicidas (moléculas)”, explica a pesquisadora.
Recentemente, nos dias 8 e 11 de março, nos ensaios nos CADs de Primavera do Leste e da Serra da Petrovina, a Fundação MT realizou o Circuito do Conhecimento – Foco em Ferrugem, e mostrou a campo, aos produtores, os dados de severidade da doença perante o manejo de fungicidas.
Em Mato Grosso, doenças foliares da soja como a Mancha alvo (Corynespora cassiicola) e Crestamento de Cercospora (Cercospora spp.) são preocupações crescentes. Já a ferrugem asiática é um problema ao qual o produtor rural está (ou deveria estar) sempre atento.
Neste período do ano, o manejo dos fungicidas está sendo definido para a safra 2022/23, e o produtor aguarda os dados climáticos do início da próxima temporada para as últimas tomadas de decisões e ajustes. “O sojicultor que vai usar uma cultivar de ciclo mais longo e/ou avançar na janela de plantio, ele já tem que ter uma preocupação maior com os fungicidas preventivos para ferrugem, construir o manejo considerando a doença. Ele precisa considerar porque dependendo do estádio que a ferrugem incide e como ela evolui, pode ser devastadora”, finaliza a pesquisadora.
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