De forma unânime, os nove membros do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central do Brasil decidiram manter a taxa básica de juros (Selic) em 10,75% ao ano, após uma longa sequência de reduções. Todos os diretores e os qualificados economistas da assessoria técnica do BC entendem que os cenários local e internacional apresentam riscos que ainda não permitem afirmar que a inflação, atualmente em 3,93%, cairá para a meta de 3%, estabelecida pelo governo federal. Lembro que a inflação está dentro da banda de variação da meta que vai de 1,5% a 4,5%.
Na teoria econômica, a taxa de juros é o principal instrumento de política monetária para conter o consumo das famílias e das empresas e, assim, frear a alta da inflação. Assim, manter a taxa de juros em patamar elevado, ajuda a inibir a pressão sobre os preços e reduzir a trajetória da inflação, conduzindo-a para a meta.
A decisão de iniciar movimento contracionista e interromper a redução da taxa de juros já era esperada por analistas, bancos, investidores e gestores de recursos.
Com a medida de manutenção da Selic já precificada, a grande notícia da semana foram as fortes críticas do Presidente Lula direcionadas à diretoria do Banco Central, particularmente ao seu presidente, o executivo financeiro Roberto Campos Neto. Lula criticou também a lei que estabeleceu a autonomia da autoridade monetária do Brasil.
As reclamações do presidente Lula são desnecessárias, inócuas e inoportunas. Ditas um pouco antes da última reunião, soaram como uma pressão explícita sobre os diretores. Ao mesmo tempo, pareciam insinuar que, caso a inflação venha a subir, a culpa é da taxa de juros alta e que o Banco Central não a reduz simplesmente porque não quer.
A decisão por unanimidade mostra que a pressão sobre os diretores não funcionou. A taxa de juros alta não define inflação. Ao contrário, é a inflação alta que exige dos bancos centrais o aumento da taxa de juros para induzir as pessoas e empresas a consumirem menos.
É bem verdade que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, cometeu erros que dão margens a críticas. Foi votar, em 2022, com uma camisa amarela que indicava seu voto no ex-presidente Bolsonaro que o indicou ao cargo. Em recente jantar em sua homenagem, oferecido pelo governador Tarciso Freitas, de São Paulo, disse estar preparado para ser seu ministro da Fazenda quando se elegesse presidente da república. Provocações pueris e desnecessárias. Especialmente em ambiente político tensionado e polarizado. Mais grave ainda por ser o primeiro a presidir o banco central independente. Ignorou os limites de prudência e diplomacia impostos pelo cargo.
A autonomia do BC no Brasil ainda é uma experiência nova, sem longo histórico. Como uma criança dando os primeiros passos. Não se pode baixar a guarda para os críticos e aqueles que sempre foram contrários.
A independência do Banco Central funciona de forma simples: o Banco Central recebe um mandato, dado pelo parlamento, para conduzir a inflação para uma meta definida pelo executivo federal. Sem interferência política, o BC transmite confiança que perseguirá e atingirá a meta, o que ajuda a manter a inflação sob controle. Seus nove diretores, o presidente inclusive, são indicados pela Presidência da República e confirmados pelo Senado Federal para um mandato de quatro anos. Não podem ser demitidos, a não ser em caso de crime ou falta grave.
O presidente Lula precisa entender que o BC autônomo, sem interferências políticas, ajuda o governo, ao combater a inflação. Inflação alta é um componente que realmente derruba a popularidade de qualquer governo, como está devidamente provado com os 30 anos do Plano Real.
A independência do Banco Central sempre foi um tema que incomoda o político Luís Inácio Lula da Silva e os partidos de esquerda e centro-esquerda. Mas precisamos lembrar que a independência do banco central da Inglaterra foi implantada pelo Partido Trabalhista, em 1997, durante a gestão do Primeiro Ministro Tony Blair. Em 2003, Lua nomeou o banqueiro Henrique Meirelles para o Banco Central, deu plena autonomia e o manteve por oito anos, mesmo quando o BC precisou levar a taxa de juros a 26,5% para combater a inflação. Quando Meirelles deixou o BC, a Selic estava em 8,75%.
O Brasil está crescendo acima das expectativas iniciais, com aumento do emprego, da renda e do consumo. No primeiro trimestre de 2024 houve crescimento do investimento. Há, pois, motivos mais nobres para se tratar do que destratar os diretores do Banco Central.
Vivaldo Lopes é economista e consultor